Primeiro de maio foi convencionado como o “Dia do Trabalho”. Porém, a cada ano, parece que temos menos para comemorar.
Na sua essência, é o trabalho que permite prover nossas necessidades, nosso sustento, nosso bem estar. Somente o trabalho possibilita a modificação simultânea da natureza, e do nosso próprio ser social, para níveis mais sofisticados ou elaborados de conforto, de civilidade ou da produção de bens e serviços.
No entanto, historicamente o mesmo foi reduzido à condição de mercadoria, negociável (quando possível, senão, é desempregado) a um preço ou conforme inúmeras (e instáveis) variáveis, no chamado “mercado de trabalho”. Pior que ser um objeto que flutua de valor (e de utilidade) em razão de elementos sob os quais não se tem controle, o trabalhador, via de regra, também perde funções essenciais da sua condição socioprodutiva, a saber, de concepção, de planejamento e de decisão sobre o que e como trabalhar, transformando o trabalho em uma atividade esvaziada de sentido, em um mero meio para se sobreviver, e em muitos casos, também em um locus de sofrimento.
Do ponto de vista individual, cada ser humano, na condição de trabalhador ou que pode fornecer força de trabalho, busca valorizar sua aptidão inerente (que virou mercadoria) com diversas estratégias, tais como a aquisição de conhecimentos, obtenção de títulos, inserção em uma profissão, busca de especializações, entre outros.
Do ponto de vista social, diversas lutas, propostas e reivindicações culminaram em uma rede estatal de produção social, retribuindo parcialmente ao trabalhador, pela sua contribuição intrínseca ao desenvolvimento, direitos e garantias sociais, possibilitando condições minimamente humanas de exercício da sua atividade produtiva, que é socialmente indispensável.
Malgrado sendo o trabalho a fonte da riqueza social, ele usufrui parcelas cada vez menores dessa mesma riqueza, que em outro momento produziu com suor e até mesmo com seu sangue. No momento, para situar melhor esse trágico e injusto movimento, temos hoje no Brasil um conjunto de proposições de reformas (algumas já aprovadas), que visam expor e isolar ainda mais o trabalhador, e tornar o mercado de trabalho ainda mais implacável com as aspirações humanas de bem estar e qualidade de vida.
Trata-se de uma ofensiva contra o trabalho e pela sua precarização, piorando suas condições de contratação, ampliando suas exigências de produção, e restringindo seu acesso a direitos básicos, como a própria aposentadoria.
Isso afronta diretamente contra qualquer ideia de desenvolvimento sustentável, aonde a melhoria do bem estar humano é ponto fundamental e seminal.
Para colocar o desenvolvimento na rota da sustentabilidade, que significa a busca pelos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) para 2030, valorizar o trabalho é condição sine qua non.
Contudo, para de fato se efetivar todos os ODS, que também podem ser lidos como desafios que colocam em xeque a própria sustentabilidade da vida humana, talvez o próprio trabalho precise dar um passo ou salto existencial ainda maior, qual seja, o de superar a sua condição de mercadoria a serviço de ser cruelmente espoliada, para uma condição soberana de trabalho emancipado, isto é, de produtores integrais.
A economia solidária já dá os primeiros sinais para isso, desenhando um horizonte de construção de um desenvolvimento alicerçado pelos produtores (trabalho emancipado) livremente associados, permitindo, inclusive, revigorar o setor público e suas instituições para uma autêntica democracia substantiva e solidariedade concreta para os humanos.
Enfim, o trabalho merece muito mais que apenas um dia comemorativo.
Edi Augusto Benini Associado Efetivo e Fundador da Associação de Apoio a Construção de um Sistema Orgânico do Trabalho Associado (Via SOT).
* Texto publicado originalmente no Informativo Mensal da Rede ODS Brasil - Edição 17, Maio de 2017.